Oficina de Legendagem e tradução reúne cineastas indígenas em São Gabriel da Cachoeira

Na abertura oficial, foram apresentados os vídeos que serão traduzidos durante a oficina.
Na abertura oficial, foram apresentados os vídeos que serão traduzidos durante a oficina.

A Oficina de Tradução e Legendagem dá seqüência às atividades realizadas no âmbito do Projeto Mapeo, uma iniciativa pioneira de valorização do patrimônio cultural dos povos indígenas do Noroeste Amazônico que vem sendo desenvolvida pela Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro-FOIRN em parceria com Instituto Socioambiental-ISA, Instituto do Patrimônio Histórico Artístico Nacional-IPHAN/Minc, Vídeo nas Aldeias e mais algumas instituições governamentais, não-governamentais e organizações indígenas da Colômbia.

O objetivo da oficina é traduzir para o português e legendar as 20 horas de gravações captadas no curso da expedição anaconda pelas câmeras dos cinegrafistas indígenas João Arimar Noronha Lana, da etnia Tariano, Adelson Meira, da etnia Tuyuka, e do cineasta Vincent Carelli do Vídeo nas Aldeias, quem coordenou os trabalhos de filmagem e registro da expedição. Com a participação de diversos conhecedores indígenas das calhas dos rios Uaupés, Papuri e Tiquié e mais alguns documentaristas, lideranças e assessores, a expedição, que ocorreu entre fevereiro e março deste ano, teve como intuito refazer parte da rota de origem dos povos indígenas da famílias linguística Tukano. Os participantes percorreram mais de 800 quilômetros no curso do rio Negro entre Manaus e São Gabriel da Cachoeira, identificando 23 sítios sagrados localizados neste trajeto e fazendo o registro dos conhecimentos e das histórias a eles relacionadas. A viagem foi apenas a primeira de uma série que vem sendo planejada no intuito de registrar o caminho percorrido pela cobra-canoa ancestral que levou os grupos indígenas de língua Tukano até os locais em que hoje vivem, na região do Alto Rio Negro. A próxima expedição terá a cidade de São Gabriel da Cachoeira como ponto de partida e a cachoeira de Ipanoré, no médio rio Waupés, como destino.

Uma das integrantes da expedição e também uma das organizadoras da oficina, Aline Scolfaro do Programa Rio Negro do ISA-Instituto Socioambiental, explica que com o material produzido na oficina de tradução e legendagem, será possível produzir um videoclipe para divulgação externa do projeto, com o objetivo de mostrar a importância do registro e preservação dos lugares sagrados para os povos do rio Negro. “É importante que o trabalho de registro dos lugares sagrados, iniciado pela expedição Anaconda seja divulgado para chamar a atenção da sociedade em geral e principalmente o governo para a importância desta iniciativa e para a necessidade de se obter apoio para expandir essas experiências”, explica Aline.

João Arimar, Tariano, 33, é cineasta de Iauaretê/Médio Waupés. O primeiro contato com uma câmera filmadora foi em uma oficina realizada após o registro da “Cachoeira das Onças”, documentário que ocorreu há 5 anos e que foi produzido no processo de registro pelo IPHAN da Cachoeira das Onças como lugar sagrado dos povos indígenas dos rios Uaupés e Papuri e Patrimônio Cultural do Brasil. Segundo ele, participou da expedição Anaconda como “câmera. Na oficina traduz as falas em Tukano para o português. Ele disse que a parte mais difícil da tradução é “tentar” traduzir termos de difícil interpretação, “algumas palavras vão assim mesmo”, afirma.

Tatiana Andrade ou Tita, Pernambucana, 30, é a facilitadora da oficina. A respeito das palavras difíceis, deixa claro: “Ainda que seja necessário dois ou até três linhas para traduzir o significado de apenas uma palavra, vamos colocar. Isso é importante para as pessoas que não entendem as línguas usadas nas gravações, para que entendam a importância daquele lugar”.

Ela atua há 4 anos no Vídeo das Aldeias, que é parceiro no projeto Mapeo e que realiza as filmagens junto aos cineastas indígenas, faz a sistematização e a pré-edição do material. Segundo ela, a oficina é mais que o trabalho de colocar legenda, é também um encontro das ferramentas tecnológicas (programas de computador) com as narrativas. “Os participantes da oficina estão aprendendo a usar as ferramentas e fazendo os recursos dialogarem com as narrativas”, explica. A respeito dos avanços da oficina ela elogia os tradutores dizendo que “são bem detalhistas, como têm experiências e uma vivencia frequente com os antropólogos, possuem conhecimento de termos e recursos linguísticos apropriados para o trabalho, por isso, espero que o vídeo possa também ter um aproveitamento acadêmico, em algum nível”.

Higino Tenório, 58, Tuyuka, na expedição Anaconda teve a função de articulador e mobilizador junto aos conhecedores e também foi um aprendiz, ressaltando que  “durante a viagem aprendi com os velhos e completei meus conhecimentos”. Na oficina é tradutor da língua Bará e Tuyuka. A respeito da oficina e ao uso das novas tecnologias como aliadas na preservação e valorização das culturas indígenas, disse que o “uso das ferramentas tecnológicas garante a perpetuação destes conhecimentos para futuras gerações”. E ainda ressalta, “mostrar para a sociedade em geral, principalmente os não-indígenas que a região do Rio Negro é ocupado desde tempos remotos e que não é uma área vazia como muitos pregam”.

Adelson Marques Tuyuka, 20, Ivo Fernandes Fontoura, 39, Nivaldo Castilho, 40, completam a equipe de tradutores na Oficina de Legendagem que começou no dia 29 de julho e vai até 13 de agosto no Pontão de Cultura do Rio Negro/FOIRN em São Gabriel da Cachoeira.

Expedição Anaconda: “Seguindo os rastros dos ancestrais”.

Sítio Temendawi, médio Rio Negro, um dos lugares sagrados visitados pela expedição.
Sítio Temendawi, médio Rio Negro, um dos lugares sagrados visitados pela expedição.

A expedição Anaconda foi realizada durante 14 dias, no período de 03 a 24 de março deste ano, que visitou 23 lugares sagrados compartilhadas na tradição narrativa grupos étnicos da família linguística Tukano. O próximo trecho do percurso a ser realizado é entre São Gabriel da Cachoeira à Ipanoré médio rio Waupés de está prevista, se tudo correr bem, para o mês de fevereiro do próximo ano. “Nas narrativas de origem a viagem da Cobra Canoa de Transformação, começou do Lago de Leite, Baía de Guanabara, que fica no rio de Janeiro até Ipanoré, Médio Waupés, foram os ancestrais totalmente “espíritos”, que ao longo da viagem se transformavam. E somente a partir de Ipanoré que nasceram os ancestrais físicos que ocuparam os territórios dados pelo criador” – explica Higino. Por isso, segundo ele, a primeira parte da expedição só será concluída quando completar o percurso que será a chegada em Ipanoré. “Do trecho de São Gabriel-Ipanoré serão visitados 20 lugares sagrados”- completa Higino.

Saiba mais:

– Entrevista com Aline Scolfaro – A Expedição Anaconda e a valorização da cultura indígena.

– Expedição inédita sai de Manaus e sobe o Rio Negro para mapear lugares sagrados

– Expedição Anaconda chega a Barcelos depois de 14 pontos de parada em uma semana de navegação

– Expedição Anaconda chega ao seu destino depois de duas semanas navegando pelo Rio Negro

Respostas

  1. Avatar de Aline

    vamos que vamos, com essa turma o trabalho vai ficar bonito! parabéns pela matéria Ray!

    1. Avatar de FOIRN - Comunicação

      Valeu Aline, com certeza juntos vamos fazer bonito.. Abraços.

  2. Avatar de yalanawi

    e as tradicoes Baniwa ? vao srr incluidas tambem ? Nao tem viagem da Anaconda igual a dos tukano… nem os maku.

    1. Avatar de FOIRN - Comunicação

      Valeu pelo comentário yalanawi, no Rio Negro existe uma diversidade enorme de culturas, cada grupo possui suas narrativas de origem diferentes entre eles, e alguns compartilham narrativas de origem comum, como é o caso das etnias da família linguística Tukano. Os Baniwa, como os demais grupos também tem suas narrativas de origem, diferente. Como foi apresentando…a expedição Anaconda é uma experiência pioneira em construção…e a proposta é exatamente essa, expandir essa experiência para as demais regiões do rio negro e incluir outros povos também. Mas, isso, exige esforços e parcerias, e principalmente recursos financeiros…e a Anaconda tem objetivo de mostrar a importância do registro e preservação dos lugares sagrados para os povos do rio Negro.

      1. Avatar de yalanawi

        Gostaria de colocar a sua disposicao todo o material fotografico e videografico que tenho colhido durante os ultimos 40 anos pesquisando entre os povos do Aiary. Inclui diversos artigos sobre lugares sagrados, fotos dos petroglifos, explicacoes dos pajes e velhos sobre os significados dos petroglifos, desenhos que os jovens fizeram sobre as figuras representadas nos petroglifos. E, finalmente, um mapa que construi junto com os velhos e outros pesquisadores da Venezuela sobre os lugares sagrados dos Baniwa/Kuripako do alto Guainia. Mas, eu quero que todo este material chegue nas maos da FOIRN, do Isaias Fontes o vice-Diretor, meu colaborador de pesquisa. O que me diz ?
        Seu Robin, o “yalanawi”

  3. Avatar de andrezaandrade

    Parabéns pela matéria, super informativa e completa!! Agora quero saber os próximos passos do projeto MAPEO. Aguardo as novidades. Abraços a todos!!

    1. Avatar de FOIRN - Comunicação

      Obrigado pelo comentário Andreza, estaremos acompanhando de perto os próximos passos do projeto, e com certeza estaremos divulgando. Abraços.

  4. […] Leia a matéria na íntegra no blog da foirn: https://foirn.wordpress.com/2013/08/07/oficina-de-legendagem-e-traducao-reune-cineastas-indigenas-em-… […]

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